Maior tribunal do Trabalho terá primeira presidente negra
A menina do balcão está sentada na mesa de audiência?? A pergunta feita em tom de estranhamento foi ouvida inúmeras vezes por Rilma Aparecida Hemetério ao assumir, como juíza, a 16ª Vara do Trabalho, em São Paulo, em 1981.
Tinha 28 anos e, apenas cinco anos antes, era mesmo Rilma quem recebia e arquivava os processos da vara em que se tornaria juíza.
No próximo dia 1º de outubro, a menina do balcão se tornará a primeira mulher negra a presidir o maior TRT (Tribunal Regional do Trabalho) do país ?o tribunal da 2ª Região, que engloba a capital paulista, Guarulhos, Osasco, região do ABC e a Baixada Santista.
A desembargadora foi eleita em um momento em que uma extensa reforma promete trazer mudanças profundas no mercado de trabalho.
Para a futura presidente do TRT-2, as regras são uma realidade que precisa ser observada. Reconhece, no entanto, que há aspectos da reforma que afrontam a Constituição, cujos capítulos que tratam dos direitos sociais se referem basicamente ao direito dos trabalhadores.
?Condições insalubres ou anti-higiênicas podem ser negociadas??, pergunta.
?Não podemos opor o que está contido na reforma com o que traz a Constituição.?
Filha de uma dona de casa e um artesão proprietário de uma pequena sapataria em Caxambu, no sul de Minas Gerais, Rilma veio a São Paulo pela primeira vez em 1967.
Ao passar na frente da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), no largo São Francisco, disse à mãe que estudaria lá. ?Você tem mania de grandeza?, ouviu.
Quando chegou a hora de prestar o vestibular, teve de escolher entre a inscrição e uma pequena viagem com as colegas de formatura do normal ?o curso de formação para dar aulas no ensino básico da época.
Pediu à freira que devolvesse o dinheiro da formatura e pegou o ônibus para São Paulo. Entrou na USP em 1971.
Instalada na casa de um tio, em Osasco, foi bancária e estagiária da Prefeitura de São Paulo e de um escritório de advocacia, além de atendente judiciária, uma forma de se aproximar de sua paixão, a Justiça do Trabalho.
O pai não tinha o diploma primário, mas não cansava de repetir que a única forma de progredir era estudando.
?Doente, ele fez minha mãe prometer que jamais deixaria a mim e meus dois irmãos sem estudo?, conta. O pai morreu em 1966, sem ter a chance de ver que a promessa foi cumprida à risca.
A família é uma mistura de negros, índios e judeus. Embora não existam documentos, Rilma diz que a bisavó paterna foi da Bahia para Minas na condição de escrava.
O bisavô tinha sobrenome espanhol, mas não o transmitiu ao avô. Rilma, portanto, desconhece a origem do Hemetério. ?Só sei que não é da Casa Grande?, diz, sorrindo.
Leia mais (08/19/2018 – 02h00)